Quem investiu tempo e recursos nesse tipo de terapia diz que valeu a pena. Os motoristas traumatizados sofrem com o simples ato de pensar em dirigir. Os sintomas mais comuns são palpitação, suor excessivo, tremedeira e até diarreia. A maioria desiste e fica anos sem conduzir ou chegar perto do banco do motorista.
"Essas pessoas precisam passar por tratamento. Não quer dizer que são doentes, mas é indispensável orientação que será muito útil não apenas na hora de dirigir, mas em toda vida", explicou a psicóloga Cintia de Carvalho Tatiyama, proprietária de clínica em São Bernardo.
Instrutor há seis anos, Clovis Verissimo Matos, 55, se dedica a ajudar mulheres como Raquel a conquistar a independência ao volante. "Elas são ansiosas. Quando percebem que quem controla o carro são elas mesmas, é um passo muito grande. É como se o mistério fosse desvendado. E elas passam a encarar o processo com mais tranquilidade", explicou o profissional.
Mulheres buscam liberdade de ir e vir
O máximo que autônoma Raquel Aparecida Caldeira, 32 anos, conseguia fazer era entrar na garagem, abrir o veículo, virar a chave e ficar trocando as marchas com o carro parado. Ela passou os últimos três anos desta maneira, sem conseguir realizar o que mais queria. "Não saía de jeito nenhum", contou. Atualmente, a autônoma tem ajuda de psicólogos e condutor especializado.
O tratamento ainda está no começo, mas ela já quebrou a primeira barreira: mesmo que devagar e acompanhada por um instrutor, consegue dirigir pelas ruas calmas de um condomínio em São Caetano. A fase ainda é a de conhecimento do veículo. Depois, vai passar a pilotar em ruas mais movimentadas, para, em seguida, obter alta.
O acompanhamento especializado dura de três a dez meses. "A maioria chega aqui em pânico, com medo, considera o carro um monstro que só vai causar tragédias. Os motivos são os mais diferentes possíveis. No primeiro momento identificamos e buscamos mostrar um caminho mais tranquilo", explicou a psicóloga Érica Teixeira, que atua em clínica de São Bernardo.
A analista fiscal Flavia Regina, 38, é habilitada há mais de dez anos, mas nunca pegou no volante depois de passar no exame prático. Ela se sentia incapaz e não havia quem pudesse ajudá-la na família e no círculo de amigos. Decidida a mudar de vida e cansada de andar e de sofrer com o transporte público, estabeleceu a meta: comprar um automóvel e colocar ponto final no medo de dirigir. "Não dá mais, coloquei na cabeça que vou superar, estou até pesquisando o valor do seguro e do meu carrinho", contou.
SEPARAÇÃO
Há quem necessite de tratamentos mais breves, em que algumas aulas com acompanhamento especializado são suficientes para driblar o medo de dirigir. São indicados para pessoas que se sentem inseguras com a violência do trânsito e querem orientações práticas de como lidar no dia a dia. É também requisitado por mulheres em busca de independência e autonomia, seja porque o marido está doente, faleceu ou se divorciou. "Quem entra aqui está atrás de mudança de vida. Dirigir é uma dessas saídas", explicou a psicóloga Érica.
"Depois de uma separação, já foi o tempo de ir ao salão de beleza e mudar o visual. Agora é hora de perder o medo de dirigir e não depender de ninguém para sair e se divertir", disse uma empresária de 30 anos, que pediu para não ser identificada.
Sem paciência, maridos dificultam aprendizado
Se uma mulher não dirige, normalmente o marido ou companheiro tem alguma relação com o problema. Motoristas com medo de dirigir e os especialistas afirmam que homens têm parcela de responsabilidade neste tipo de trauma.
Falta de paciência, gritos e a insegurança dos próprios parceiros são as causas mais comuns para a motorista não conseguir sair do lugar, mesmo sendo habilitada e capacitada. "Os maridos atrapalham muito, principalmente por causa das críticas. Alguns ficam com ciúmes e chegam a esconder a chave do carro", contou a psicóloga especialista em fobia de trânsito Érica Teixeira.
Esse foi a caso da vendedora Marizete Araujo, 46 anos. Cansada de pedir para o marido ajudá-la, decidiu depois de uma briga aprender a dirigir. Matriculou-se em uma autoescola, fez o curso completo, tirou a habilitação. Ao sair com o carro do marido pela primeira vez, subiu na calcada e foi xingada por ele.
"Parecia o fim da minha curta vida de motorista", contou. Atualmente ela decidiu buscar o treinamento em uma clínica em Santo André. "Quando estiver apta vou pegar o carro e fazer as minhas próprias coisas", disse.
fonte: http://www.dgabc.com.br